Coronavírus e relações de trabalho

MP n. 927/2020: CORONAVÍRUS x Relações de Trabalho

Ontem, dia 22 de março de 2020, o Presidente da República adotou a Medida Provisória n. 927, dispondo sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente do coronavírus (covid-19).

 A Medida Provisória (MP) busca uma flexibilização dos direitos trabalhistas, a fim de minimizar a crise. Durante o estado de calamidade pública, o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.

O disposto nesta medida se aplica durante o estado de calamidade pública e, para fins trabalhistas, constitui hipótese de força maior, nos termos do art. 501 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador. A MP lista uma série de condutas que podem ser adotadas pelos empregadores. Vejamos:

1 TELETRABALHO

O teletrabalho já estava previsto na CLT desde a reforma trabalhista.  A Medida Provisória apenas simplificou a sua pactuação. Durante a calamidade, o empregador pode, a seu critério, determinar, unilateralmente, que os empregados passem a laborar em regime de teletrabalho.

Fica dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual. A alteração será notificada ao empregado com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, por escrito ou por meio eletrônico.

 As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho.

Nos casos em que o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial. Na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.

Ainda, o regime de teletrabalho fora permitido para os estagiários e aprendizes

2. A ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS

O empregador poderá antecipar as férias de seus colaboradores, mesmo para aqueles cujos períodos aquisitivos não tenham sido completados. O aviso das férias poderá ser por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado. O período de férias não pode ser inferior a cinco dias corridos.  Alterações significativas quanto às férias:

  1. o empregador deverá notificar a concessão das férias com, pelo menos, 48 horas de antecedência. Na férias tradicionais, exige-se o prazo mínimo de 30 dias;
  2. o pagamento da remuneração de férias poderá ser realizado juntamente com o da remuneração, ou seja, até o 5º dia útil do mês seguinte ao início do gozo das férias. Nas férias tradicionais, o pagamento deveria ocorrer em até 2 dias antes das férias;
  3. o pagamento do terço constitucional pode ocorrer em momento posterior, até a data em que é devida a gratificação natalina, ou seja, até 20 de dezembro deste ano;
  4. ao contrário do que ocorre em situações normais, o abono pecuniário (conversão de até 10 dias de gozo férias  em  dinheiro) só  pode acontecer  se a  empresa   concordar.

Ainda, a MP destacou que os trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do covid-19 serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas. Bem como, poderão ser interrompidas as férias de profissionais da área de saúde ou funções consideradas essenciais (previstos no Decreto 10.282/2020).

3. A CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS

Além das alterações quanto às férias individuais, a MP 927 também flexibilizou a concessão de férias coletivas. Durante o estado de calamidade pública, o empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas e deverá notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas.  Alterações:

a) poderá ser concedido período de férias com duração inferior a 10 dias corridos;

b) não há a aplicação do limite máximo de períodos anuais. Ou seja, poderá haver mais de 2 períodos de férias ao ano;

c) ficam dispensadas a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e aos sindicatos representativos da categoria profissional.  

4. APROVEITAMENTO E A ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS

 Durante o estado de calamidade pública, os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados civis (não religiosos) e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico,  com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. Isso poderá ser feito sem a necessidade de negociação coletiva. Exemplo: se a empresa suspender suas  atividades nos dias 25, 26 e 27 de março deste ano. Poderão, futuramente, ser compensados,  os feriados de 21 de abril, primeiro de maio e 07 de setembro, por exemplo.

Essa      regra   se aplica aos feriados civis. Tratando-se de feriados religiosos, é  exigido a    concordância do empregado,   por escrito

5. BANCO DE HORAS

Poderá ser flexibilizado o estabelecimento do banco de horas durante a pandemia. A MP detalhou a compensação por até  18 meses, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública.

A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo. 

A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias.

6. SUSPENSÃO DAS EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHO 

A MP 927 alterou a obrigatoriedade de exigências de exames clínicos ocupacionais, complementares. O Exame demissional continua necessário. Seu prazo, no entanto, foi alterado para o prazo de até 60 (sessenta) dias após o encerramento do Estado de Calamidade Pública decorrente do Decreto Legislativo 6/2020. O prazo do estado de calamidade decretado é 31/12/2020. 

O Exame demissional será dispensado nos casos em que o empregado tenha realizado exame médico ocupacional em menos de 180 dias. 

Estão suspensos, também, a obrigatoriedade dos treinamentos periódicos previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde do trabalho. Caso tenha interesse, a empresa poderá realizar os treinamentos na modalidade de Ensino a distância (virtual). 

Os mandatos das comissões de prevenção de acidentes (CIPA) poderão ser mantidos e os processos eleitorais em cursos, suspensos.

7. DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO (SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO)

O Art. 18 da MP 927/20 foi revogado. Assim, inaplicável a suspensão do contrato de trabalho.

8. DO DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA E TEMPO DE SERVIÇO

A medida provisória também alterou os prazos de recolhimento do FGTS. O FGTS devido nas competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser parcelado em até 6 parcelas, sem multa ou atualização. O vencimento inicial, o dia 7, iniciando no mês de julho de 2020. 

O requisito para usufruir dessa modalidade de parcelamento é que o empregador declare as informações até dia 20/06/2020.  

Tratando-se de FGTS rescisório, o pagamento deve ser realizado no prazo normal. 

Os certificados de regularidade emitidos antes da entrada em vigor da Medida Provisória serão prorrogados por mais 90 (noventa) dias. Parcelamento de débitos do FGTS que tenham vencimento em março, abril e maio não impedirão a emissão do certificado de regularidade.

9. ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE

Os estabelecimentos de saúde poderão, mediante acordo individual escrito, até mesmo para jornadas de 12×36, o seguinte: 

I – Prorrogar a jornada de trabalho, com fundamento em “necessidade imperiosa” (art. 61, CLT); 

II – Adotar escalas de hora suplementar, entre a décima terceira e vigésima quarta hora do intervalo intrajornada, sem penalidades administrativas, desde que observado o repouso semanal remunerado; 

As horas suplementares poderão ser compensadas, no prazo de 18 (dezoito) meses a contar do encerramento do estado de calamidade pública (31/12/2020).

10. PRAZOS PROCESSUAIS ADMINISTRATIVOS

Os prazos para apresentação de defesa ou recurso administrativo no âmbito de infrações trabalhistas e notificações do débito do FGTS ficam suspensos por 180 (cento e oitenta) dias.

11. CONTAMINAÇÃO DO CORONAVIRUS E ACIDENTE DO TRABALHO

A MP rege que eventuais casos de contaminação pelo coronavírus (COVID-19) de empregado que esteja trabalhando não poderá ser considerada doença ocupacional. Somente será considerada doença ocupacional caso fique comprovado que o empregado teve a contaminação em razão do trabalho. 

Essa hipótese, cumpre dizer, é aplicável para fins da estabilidade provisória do empregado, prevista no Art. 118 da Lei 8.213/91.

12. ACORDOS E CONVENÇÕES DE TRABALHO – PRORROGAÇÃO

A MP também dispôs que os acordos e convenções de trabalho, vencidos ou vincendos no prazo de 180 (cento e oitenta dias), poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 (noventa) dias.

13. FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO

A fiscalização do trabalho, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da entrada em vigor da MP, atuará de maneira orientadora. Esse princípio já é aplicável às empresas do SIMPLES nacional, onde trata da dupla visita

Assim, eventuais irregularidades das empresas não poderão ser objeto de autuação (multa) de imediato. 

Somente poderão ser multadas, de imediato, as empresas que:

  1. Não tenham empregado registrado, e que a queixa venha a partir de denúncia; 
  2.  Situações de grave ou iminente risco; 
  3.  Ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente; 
  4.  Trabalho nas condições análogas de escravo ou trabalho infantil. 

14. TRABALHADORES DE TELEMARKETING

A medida provisória afastou as normas regulamentadores atinentes a teleatendimento e a telemarketing aos trabalhadores que estejam em regime de teletrabalho. 

15. ANTECIPAÇÃO DO PAGAMENTO DO ABONO ANUAL EM 2020

O abono anual aos beneficiários da previdência social, que durante o ano de 2020 tenha recebido auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio reclusão, será efetuado em duas parcelas. 

I – a primeira parcela corresponderá a cinquenta por cento do valor do benefício devido no mês de abril e será paga juntamente com os benefícios dessa competência; e 

II – a segunda parcela corresponderá à diferença entre o valor total do abono anual e o valor da parcela antecipada e será paga juntamente com os benefício da competência maio.

16. CONVALIDAÇÃO DE MEDIDAS TRABALHISTAS REALIZADAS 

Em que pese a MP ter entrado em vigor ontem, dia 22/3/2020, ela possui efeitos retroativos. Ou seja, torna válidas as medidas adotadas pelos empregadores nos 30 dias anteriores a sua entrada em vigor. 

Assim, todos empregadores que, por exemplo, concederam férias coletivas aos empregados antes da entrada em vigor da MP, mesmo que sem notificação prévia ao sindicato, não poderão ser autuados em razão de tal ato. 

17. PRORROGAÇÃO DE VALIDADE DE CERTIDÕES FISCAIS

A MP também prorrogou a validade de certidões fiscais federais, determinado que o prazo da CND é de 180 (cento e oitenta) dias a contar da sua emissão. Esse prazo poderá ser prorrogado em ato conjunto da Receita Federal e Procuradoria da Fazenda Nacional. 

Por fim, a MP possui validade limitada ao estado de emergência! A princípio, estas regras são  temporárias   e válidas somente até 31/12/2020.

Caso tenha dúvidas, entre em contato, por telefone ou e-mail, claro! Pois, lembre-se: FIQUE EM CASA!