Você financiou um carro, pagou algumas parcelas, depois, a coisa apertou e você não conseguiu pagar as demais? Seu carro pode, sim, ser apreendido. Há o risco de busca e apreensão do veículo.
Isso porque, no contrato de financiamento, o devedor tem a posse direta do veículo, mas não tem a propriedade. Só terá a propriedade do automóvel quando estejam pagas todas as parcelas.
A busca e apreensão de veículos ocorre por meio de um processo judicial quando existem parcelas do financiamento em atraso e, para garantir o recebimento, o banco poderá retomar o bem. Pois, você, de fato, deixou de pagar. Você é responsável pelo débito em aberto.
Mas, se você fez acordo, renegociou o débito, quitou integralmente a dívida e, mesmo assim, a financiadora não lhe entregou a carta de anuência e seu nome segue protestado, saiba que isso gera danos morais. Afinal, você pagou a dívida e mesmo assim o banco não entrega o documento necessário para que você possa dar baixa no protesto.
Após o cumprimento do acordo, o banco deve estregar a CARTA DE ANUÊNCIA, para que o devedor possa dar baixa, junto aos cartórios, das restrições em seu nome.
Diante das irregularidades, cabe pedido de tutela de urgência para que a financeira retire IMEDIATAMENTE o protesto e a indenização pelos danos morais sofridos, ante a manutenção irregular de protesto.
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (CDC)
A relação havida entre o banco e o cliente configura uma relação de consumo, uma vez que o cliente subsuma-se na definição de consumidora, enquanto que o banco adéqua-se, perfeitamente, ao conceito de fornecedor, tendo em vista o disposto nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
DA RESPONSABILIDADE DA FINANCEIRA
Após o devedor ter realizado o pagamento do débito, dando quitação integral, o banco deve entregar a Carta de Anuência necessária para a efetiva baixa no protesto feito. Para a dívida em questão, faz-se necessária a declaração de anuência, com identificação e firma reconhecida do credor, no caso, o banco, como instrumento legítimo para o cancelamento do protesto (§ 1º do art. 26 da Lei n. 9.492/97), em tempo razoável:
Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.
§ 1º Na impossibilidade de apresentação do original do título ou documento de dívida protestado, será exigida a declaração de anuência, com identificação e firma reconhecida, daquele que figurou no registro de protesto como credor, originário ou por endosso translativo.
O art. 2º da Lei n. 6.690/79, por sua vez, assim dispõe:
Art 2º Será cancelado o protesto de títulos cambiais posteriormente pagos mediante a exibição e a entrega, pelo devedor ou procurador com poderes especiais, dos títulos protestados, devidamente quitados, que serão arquivados em cartório.
Resta pacificado na jurisprudência que, ao credor, cabe a entrega dos documentos necessários à baixa do protesto, prescindindo, neste caso, de requerimento da parte devedora, precipuamente quando o adimplemento da dívida se deu na data ajustada pelas partes, o que faz presumir conhecimento da instituição financeira acerca do ato e o dever de fornecer a carta de quitação.
A jurisprudência é farta no sentido de que é responsabilidade do credor fornecer os documentos necessários para que o devedor possa dar baixa no ato notarial::
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73) – AÇÃO DE ANULAÇÃO DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. IRRESIGNAÇÃO DA DEMANDADA. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, recebido o pagamento da dívida pelo credor, é dever deste entregar a documentação necessária para o requerimento da baixa do protesto, sendo desnecessário o pedido formal por parte do devedor. Quando o credor recebe o pagamento, mas não remete ao devedor os documentos necessários para o cancelamento do protesto, ocorre afronta ao princípio da boa-fé objetiva, configurando ato ilícito e a consequente obrigação de indenizar. Incidência da Súmula 83 do STJ. 3. Agravo regimental desprovido (STJ, AgRg no AREsp n. 821.749/MT, rel. Min. Marco Buzzi, j. 2-5-2017) (Grifou-se)
É dever do credor entregar a documentação necessária para o requerimento da baixa de protesto (STJ, AgInt no AREsp n. 950.816/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 20.3.2018). (TJSC, Recurso Inominado n. 0300078-74.2017.8.24.0035, de Ituporanga, rel. Des. Reny Baptista Neto, Sexta Turma de Recursos – Lages, j. 27-09-2018).
Com a QUITAÇÃO TOTAL, o banco é o responsável pela manutenção indevida do protesto, devendo, pois, arcar com os danos causados.
DO DANO MORAL
O dano moral é aquele que afeta a personalidade e, de alguma forma, ofende a moral e a dignidade da pessoa.
A honra é um bem personalíssimo (CF, art. 5º, X), juridicamente tutelado. A pretensão do Requerente funda-se, ainda, nos artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro, que preconizam:
Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
O comportamento imprudente da empresa financeira constitui inegável ofensa à honra da pessoa do devedor, com a configuração de dano moral indenizável, havendo a manutenção indevida do protesto, por um valor já quitado.
Nesse sentido, já é consolidado o entendimento jurisprudencial:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROTESTO DE TÍTULO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. BAIXA DO PROTESTO. INCUMBÊNCIA QUE, EM REGRA, CABE DO DEVEDOR. MATÉRIA JULGADA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. HIPÓTESE EM QUE O CREDOR NÃO DEVOLVE O TÍTULO DE CRÉDITO OU NÃO ENTREGA A CARTA DE ANUÊNCIA. RESPONSABILIDADE DO CREDOR PELA MANUTENÇÃO INDEVIDA DO PROTESTO. SÚMULA 7/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.
[…] 2. Em regra, “No regime próprio da Lei n. 9.492/1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto” (REsp 1339436/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/09/2014, DJe 24/09/2014) 3. Na hipótese, o credor deverá ser responsabilizado pela manutenção indevida do nome do devedor no protesto de título, uma vez que não devolveu o título ou a carta de anuência, documentos necessários ao cancelamento da negativação. […] (STJ, AgRg no REsp 1289729/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, j. 23/02/2016) […] (TJSC, Recurso Inominado n. 0301498-38.2017.8.24.0125, de Itapema, rel. Des. Mauro Ferrandin, Sétima Turma de Recursos – Itajaí, j. 05-08-2019). (Grifou-se).
Observa-se um abuso por parte do banco, devendo a este o pagamento pelos danos morais suportados.
DO QUANTUM INDENIZATÓRIO
A indenização mede-se pela extensão do dano, conforme art. 944, CC. Primordialmente, ressalta-se que os critérios para definição do valor indenizatório são subjetivos, uma vez que cada caso julgado é único e não é possível, dessa forma, predeterminar parâmetros de cálculo.
Assim, o quantum indenizatório deve ser arbitrado de forma a compensar a vítima pela dor sofrida, sem causar-lhe enriquecimento ilícito ou mesmo tornar vantajoso o abalo sofrido. Simultaneamente, deve desempenhar função pedagógica e repressora para o ofensor, a fim de evitar novas práticas abusivas.
Em um julgado semelhante ao caso da Requerente, manteve-se em R$ 15.000,00 (quinze mil reais) o valor da indenização. Vejamos:
RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROTESTO DE TÍTULO REGULAR. MANUTENÇÃO DE PROTESTO APÓS QUITAÇÃO INTEGRAL DO DÉBITO. DEMORA INJUSTIFICADA NA CONCESSÃO DE CARTA DE ANUÊNCIA PARA BAIXA DO REGISTRO. RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CARACTERIZADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA NO TOCANTE À EXISTÊNCIA DE DANO, BEM COMO AO QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO (R$ 15.000,00). MONTANTE ARBITRADO EM CONSONÂNCIA COM OS PARÂMETROS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. […] A equação norteadora da reparação do dano extrapatrimonial deve conter em sua fórmula a ideia de compensação, sem lucro, e punição, como fator de desestímulo, preservando-se o equilíbrio entre os cabedais de quem deverá receber o que lhe cabe e daquele que deverá cumprir o que lhe foi imposto, em premissas plenamente atendidas no estipulado montante revelado no veredito unipessoal. SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS (ART. 46 DA LEI Nº 9.099/95) (TJSC, Recurso Inominado n. 0820793-76.2014.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Roberto Lepper, j. 23-09-2015). INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA. ALTERAÇÃO DO TERMO INICIAL. RELAÇÃO CONTRATUAL. REFORMA PARA INCIDÊNCIA DOS JUROS DESDE A DATA DA CITAÇÃO. ADEQUAÇÃO DE OFÍCIO. “A correção monetária e os juros de mora, consectários legais da condenação, são temas de ordem pública e podem ser modificados de ofício pelo órgão ad quem.” (TJSC, Apelação Cível n. 2014.048934-0, de Joinville, rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, j. 13-08-2015). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. (TJSC, Recurso Inominado n. 0300718-14.2014.8.24.0090, da Capital – Norte da Ilha, rel. Des. Rudson Marcos, Primeira Turma de Recursos – Capital, j. 11-08-2016). (Grifou-se)
Portanto, se você está passando por esta situação ou conhece alguém que esteja, fique atento as suas obrigações e as obrigações do banco. A manutenção do protesto, após a quitação integral do débito, é irregular!